Que laços judaicos com Jerusalém?
por Daniel Pipes
New York Sun, 20 Junho 2006
Original em inglês: What Jewish Ties to Jerusalem?
Tradução: Márcia Leal
Adaptação: K. Sliver
Historicamente, o valor religioso de Jerusalém, para os muçulmanos, oscilou entre o mais e o menos conforme as circunstâncias políticas. Num ciclo uniforme e previsível que se repetiu seis vezes ao longo de catorze séculos, os muçulmanos voltaram-se para a cidade quando isso lhes foi útil e ignoraram-na quando não foi.
Esse contraste tornou-se especialmente óbvio no século passado. De 1917 a 1948, o Mandato Britânico sobre a cidade galvanizou uma paixão por Jerusalém jamais vista nos quatrocentos anos de domínio otomano. Porém, quando a Cidade Velha esteve sob o controle da Jordânia entre 1948 e 1967, os árabes pouco se lembraram dela. Não era de Al-Aqsa, por exemplo, que as rádios jordanas transmitiam as orações das sextas-feiras, mas de uma mesquita menos importante, em Amã. O documento fundador da Organização para a Libertação da Palestina, o chamado Pacto Nacional Palestiniano, que data de 1964, não menciona Jerusalém uma vez sequer.
O interesse muçulmano pela cidade só reapareceu com a conquista de Jerusalém pelos israelitas em 1967. Então Jerusalém tornou-se o ponto central da política árabe, servindo como factor de unificação entre os elementos discordantes. Em 1968, a OLP alterou o texto do pacto para se referir a Jerusalém como "a sede da Organização para a Libertação da Palestina". O próprio rei da Arábia Saudita declarou a cidade "equivalente" a Meca do ponto de vista religioso — uma ideia original, para não dizer blasfema.
Em 1990, a fixação islâmica por Jerusalém tinha alcançado uma intensidade tão surreal, que os árabes palestinianos passaram das celebrações à negação da importância sagrada e histórica da cidade para os judeus. O establishment árabe palestiniano — académicos, clérigos e políticos — popularizou essa afirmação improvável estruturando uma argumentação revisionista com partes iguais de manipulação, mentira, ficção e fraude. A fórmula apaga qualquer vínculo dos judeus com a terra de Israel, colocando em seu lugar uma espúria conexão árabe palestiniana.
Agora, os árabes palestinianos alegam que os cananeus construíram o Templo de Salomão, que os antigos hebreus pertenciam a tribos beduínas, a Bíblia veio da Arábia, o Templo dos judeus "ficava em Nablus ou talvez em Belém", a presença judaica na Palestina cessou em 70 EC, e os judeus de hoje são descendentes dos turcos cazares. O próprio Yasser Arafat tirou do nada um inexistente rei cananeu, Salém, fazendo as mais tocantes referências a esse fantasioso "ancestral".
O Palestinian Media Watch resume todo o processo: ao transformar os cananeus e os israelitas em árabes e o Judaísmo da antiga Israel em Islamismo, a Autoridade Palestiniana "toma a autêntica história dos judeus, documentada por milénios de literatura, risca a palavra ‘judaico' e sobrepõe a palavra ‘árabe'".
A implicação política é bem clara: os judeus não têm quaisquer direitos sobre Jerusalém. Como avisava uma faixa de rua: "Jerusalém é árabe." Os judeus não são bem-vindos.
Para Yitzhak Reiter, da Universidade Hebraica, três factos foram decisivos para a conversão dessa mitologia auto-complacente em ideologia oficial:
- O incidente dos Fiéis do Monte do Templo, um grupo de judeus que em Outubro de 1990, no esforço mal-sucedido de lançar a pedra fundaconal do Terceiro Templo, desencadeou um tumulto em que dezassete muçulmanos perderam a vida. O episódio exacerbou entre os árabes palestinianos o receio de ver demolidos os santuários islâmicos e estimulou-os a provar que Jerusalém sempre foi muçulmana e árabe palestiniana.
- O acordo de Oslo, de Setembro de 1993, que pela primeira vez colocou Jerusalém sobre a mesa de negociação. Os árabes palestinianos responderam com uma tentativa de desacreditar a ligação dos judeus com a cidade.
- A cimeira de Camp David, de Julho de 2000, em que o governo israelita, também pela primeira vez, expôs as suas reivindicações de soberania sobre certas áreas do Monte do Templo. Na observação mordaz de
A negação árabe palestiniana dos laços judaicos com Jerusalém tem provavelmente duas consequências a longo prazo. Em primeiro lugar, ela sugere que a atracção dos árabes palestinianos pela cidade chegou a um tal fervor que se sustém indiferente à política, quebrando assim um padrão de catorze séculos. Jerusalém parece ser hoje a expressão de um interesse muçulmano duradouro, capaz de gerar sentimentos de posse não mais relacionados a considerações utilitárias.
Em segundo lugar, essa negação limita as perspectivas de uma saída diplomática. Com as suas falsificações auto-evidentes, a história árabe palestiniana aliena mais os interlocutores israelitas exactamente por reivindicar direitos exclusivos sobre a cidade inteira. Em resultado, futuras negociações sobre Jerusalém serão forçosamente mais emocionais, tortuosas e difíceis que as anteriores.
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