Observatório da Jihad


24.5.06

Aprendizagens da infâmia

por Vasco Graça Moura
Diário de Notícias, 24 Maio 2006

«Em 21 de Março deste ano, realizou-se no Parlamento Europeu uma conferência sobre o papel dos livros escolares no conflito do Médio Oriente. Tratava-se de analisar a maneira como os judeus, Israel e o processo de paz são vistos nos manuais palestinianos, árabes e iranianos e, simetricamente, a maneira como árabes, palestinianos, o Islão e a paz são abordados nos manuais israelitas. Estão agora disponíveis na Internet (www.edume.org) as análises elaboradas por Yohanan Manor e Arenon Goiss, membros do CMIP (Center for Monitoring the Impact of Peace) que participaram na conferência e levaram a cabo uma análise bastante completa dos manuais escolares israelitas e palestinianos.Das respectivas conclusões resulta, quanto a Israel, que há nos manuais em uso neste país no ano de 2002, com poucas excepções nos adoptados pelo judaísmo ultra-ortodoxo, "um esforço visível para promover os valores da paz, melhorar a percepção do outro lado, e estimular o respeito mútuo e as relações pacíficas entre as partes em conflito", acentuando-se os valores comuns ou partilháveis da tradição bíblica e procurando-se levar o estudante a compreender os pontos de vista do adversário e a necessidade de se encontrar soluções mutuamente aceitáveis: não se evitam pontos sensíveis e politicamente controversos, nem mesmo "alguma crítica da política israelita com respeito à dinâmica anterior à guerra".Quanto à Autoridade Palestiniana, as coisas são bem mais complicadas. As conclusões respeitam aos manuais em uso em 2005 em que, diferentemente de casos anteriores, se assinala mais informação dada ao estudante a propósito do mundo ocidental e se destaca, num dos livros, a apresentação de "um inimigo morto como um ser humano que tem uma família", noutro, uma citação de Ben Gurion e, noutro ainda, uma citação de líderes religiosos em Jerusalém que se referem a Israel como um estado soberano.Mas os pontos negativos são inúmeros. A atitude quanto a Israel e quanto à paz é, nos livros mais recentes, semelhante à das edições anteriores e por vezes ainda pior, em matéria de anti-semitismo. Citam-se os Protocolos dos Sábios de Sião, já utilizados pela propaganda hitleriana, como um conjunto de resoluções confidenciais do primeiro congresso sionista. Não se fala num ideal de paz com Israel. Acentua-se a superioridade religiosa e moral do Islão e dos Muçulmanos depreciando-se com arrogância as outras religiões e seus seguidores. Continua a não se reconhecer Israel como estado soberano e a omiti-lo dos mapas. Nunca se menciona o território israelita enquanto tal. Suprime-se qualquer relação de Jerusalém com a história judaica, mesmo quando se abordam pontos bíblicos. Não há nenhuma referência positiva aos judeus. O sionismo é apelidado de racismo. Apresenta-se uma longa lista das "malfeitorias" de Israel. O conflito israelo- -árabe e a história do problema palestiniano "não são apresentados de maneira objectiva e honesta". Inculca-se a Palestina como a vanguarda da luta entre o Islão e os seus inimigos. Os acordos de Oslo de 1993 são vistos como uma etapa da Intifada contra Israel. Prossegue a exaltação da Jihad e do suicídio bombista. Há desigualdade de critérios de tratamento: "nem Israel nem os judeus têm qualquer espécie de direitos e os ideais de paz e tolerância não se lhes aplicam, excepto numa referência implícita contida num manual para alunos cristãos"...A análise conclui que "a juventude palestiniana não está a ser educada para aceitar e coexitir com a outra parte do conflito. A Autoridade Palestiniana está a ensinar à sua geração mais jovem que a exigência de paz e liberdade é inseparável da rejeição da legitimidade da existência de Israel".Face a alguns exemplos concretos que constam do corpo do documento, pode dizer-se que a síntese acima é bastante edulcorada. Mas a questão não é nova. Já na anterior legislatura a Comissão Europeia tinha sido interpelada, a propósito dos livros escolares palestinianos e do papel destes no incitamento ao ódio e à violência, por se suspeitar de que o auxílio europeu destinado à educação na Palestina estivesse a ser utilizado para fomentar a criação desse clima. E lembro-me de que, nessa altura, o comissário Chris Patten negou formalmente que assim fosse. Todavia o problema subsiste. E a Europa preocupa-se tanto em "exportar" os direitos humanos que seria tragicamente grotesco acabasse a financiar estas aprendizagens da infâmia.»